domingo, 14 de dezembro de 2014

JVDFM PODE JULGAR EXECUÇÃO DE ALIMENTOS POR ELE FIXADOS

É de lição basilar que os alimentos são fixados, revisados e exonerados perante às Varas de Família, ou nas Cíveis ou únicas que acumulem a competência típica da especializada, salvo em se tratando de alimentos com base na "Convenção sobre a Prestação de Alimentos no Estrangeiro" (Convenção de Nova York), cuja competência é da Vara Federal da Capital da Unidade Federativa em que reside o devedor (Lei n. 5.478/68, art. 26).

Doutra banda, sabe-se que a Lei Maria da Penha (Lei n. 11.340/06), em seu art. 14, estabelece que os Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher (JVDFM) são órgãos de competência mista, criminal e cível, e poderão ser criados para o processo, o julgamento e a execução das causas decorrentes da prática de violência doméstica e familiar contra a mulher.

Pois bem. Como o legislador deixou de especificar as causas que não se enquadrariam na competência cível dos JVDFM, o STJ entendeu, no julgamento do Recurso Especial n. 1.475.006-MT, da relatoria do ministro Moura Ribeiro, que tais órgãos têm competência para julgar a execução de alimentos que tenham sido fixados a título de medida protetiva de urgência, em favor de filho do casal em conflito.

Em suas razões de decidir, conforme extraído de Informativo, assentou a Corte que: “[...] da literalidade da lei, é possível extrair que a competência desses juizados compreende toda e qualquer causa relacionada a fato que configure violência doméstica ou familiar e não apenas as descritas expressamente na referida lei. E assim é, não só em razão da lei, mas também em razão da própria natureza protetiva que ela carrega, ou seja, é a sua naturalia negotii.”

Diante disso, verifica-se que, além dos juízos típicos aludidos, os alimentos também poderão ser fixados pelo JVDFM, inclusive, liminarmente, com natureza de provisionais, assim como por ele executados, sempre que configurada a violência doméstica ou familiar que justifique a concessão de medida protetiva de urgência.

Por fim, é salutar esclarecer que nas Comarcas que inexistem o JVDFM, o juízo criminal competente para aplicar a Lei Maria da Penha não pode fixar nem executar alimentos, cabendo essa competência às Varas de Família ou Cíveis, onde não houver a especializada.

STJ ADMITE A ADOÇÃO DE NETO POR AVÓS ANTE A IDENTIFICAÇÃO DO VÍNCULO SOCIOAFETIVO

Sabe-se que o §1º do art. 42, do ECA, veda a adoção por ascendentes. Destarte, em regra, avós não podem adotar netos. Com isso, o legislador ordinário buscou evitar interesses patrimoniais e/ou assistenciais, bem como eventual confusão mental e patrimonial decorrente da transformação dos avós em pais, ou seja, do comprometimento da ordem natural existente entre parentes.

Acontece que, deve-se reconhecer que as estruturas familiares se encontram em plena mutação, estando a legislação longe de alcança-las. Isso ficou bem evidenciado no caso analisado pelo STJ, no âmbito do Recurso Especial n. 1.448.969/SC, da relatoria do ministro Moura Ribeiro. Em resumo, eis as suas particularidades descritas em Informativo da Corte: 
os avós haviam adotado a mãe biológica de seu neto aos oito anos de idade, a qual já estava grávida do adotado em razão de abuso sexual; os avós já exerciam, com exclusividade, as funções de pai e mãe do neto desde o seu nascimento; havia filiação socioafetiva entre neto e avós; o adotado, mesmo sabendo de sua origem biológica, reconhece os adotantes como pais e trata a sua mãe biológica como irmã mais velha; tanto adotado quanto sua mãe biológica concordaram expressamente com a adoção; não há perigo de confusão mental e emocional a ser gerada no adotando; e não havia predominância de interesse econômico na pretensão de adoção.”

Pois bem, em hermenêutica concretista, típica de um juiz pro ativo (ou social), aduziu o relator que, à luz da proteção integral à criança e ao adolescente, bem como da condição peculiar da criança e do adolescente como pessoas em desenvolvimento (ECA, art. 1º e 6º), cuja garantia do melhor interesse deve ser observada, em efetivação ao princípio da dignidade da pessoa humana, “não cabe mais ao Judiciário fechar os olhos à realidade e fazer da letra do § 1º do art. 42 do ECA tábula rasa à realidade, de modo a perpetuar interpretação restrita do referido dispositivo, aplicando-o, por consequência, de forma estrábica e, dessa forma, pactuando com a injustiça”.

Com efeito, apreciando o pleito de adoção formulado, o STJ concluiu pela mitigação do disposto no § 1º do art. 42 do ECA, sob o argumento de que o mesmo objetiva alcançar situação distinta da referida no caso enfrentado. Assim, a Corte acabou por admitir, excepcionalmente, a adoção de neto por avós, tendo em vista a necessária regularização da filiação socioafetiva identificada. 

NOVO PRAZO PRESCRICIONAL PARA COBRANÇA DAS CONTRIBUIÇÕES NÃO RECOLHIDAS PARA O FGTS

É cediço que a Lei do FGTS (Lei n. 8.036/90), em seu art. 23, §5º, assim como o Decreto regulamentador (Decreto n. 99.684/90), em seu art. 55, caputinstituíram o prazo prescricional de 30 anos para cobrança de valores não depositados no Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS), respeitado o prazo de dois anos após o término do contrato de trabalho para a propositura da ação trabalhista, consoante inciso XXIX, do artigo 7º, da Constituição da República.

No mesmo sentido é o enunciado da Súmula n. 362 do TST, que prescreve: “É trintenária a prescrição do direito de reclamar contra o não-recolhimento da contribuição para o FGTS, observado o prazo de 2 (dois) anos após o término do contrato de trabalho”.

Ocorre que, recentemente, no julgamento do Recurso Extraordinário com Agravo ARE 709.212/DF, com Repercussão Geral, de relatoria do ministro Gilmar Mendes, por maioria, o Tribunal Pleno do STF entendeu ser inconstitucional e, portanto, inválidas as aludidas regras na parte em que fixam o prazo prescricional trintenário para o FGTS, haja vista violarem o disposto no art. 7º, XXIX, da Constituição da República.

E qual seria o prazo?

Para o Pretório Excelso o prazo prescricional para a cobrança das contribuições não recolhidas para o FGTS é quinquenal, observado o limite de dois anos após a extinção do contrato de trabalho, tudo conforme reza o disposto no art. 7º, XXIX, da Constituição da República. Com isso, restou prejudicado o enunciado da Súmula n. 362 do TST.

Por derradeiro, frise-se que o STF, em modulação dos efeitos, atribuiu a decisão efeito ex nunc (não retroativos). Assim, acabou por firmar entendimento no sentido de que os casos cujo termo inicial da prescrição (ausência de depósito no FGTS) ocorra após a data do julgamento (13.11.2014), aplica-se, desde logo, o prazo de cinco anos. Já para os casos em que o prazo prescricional já esteja em curso, aplica-se o que ocorrer primeiro: 30 anos, contados do termo inicial, ou cinco anos, a partir do julgamento referido (13.11.2014), tudo nos termos do voto do relator.

sábado, 26 de julho de 2014

O PARÁGRAFO DA “GAVETA” NA EMENDA À CONSTITUIÇÃO ESTADUAL




Por Henrique Batista

Após quase 25 anos de sua promulgação, a Constituição do nosso estado passou por recente e profunda emenda sob o pretexto de atualização e compatibilidade com a Constituição Federal, o Texto Maior.
Dentro das inovações perpetradas pela Assembleia Legislativa, um parágrafo do seu texto, prima facie, me casou estranheza. Isso porque, além do aparente desrespeito as técnicas de boa redação previstas no artigo 11 da Lei Complementar Federal n. 95/98, os conceitos indeterminados e imprecisos utilizados proporcionam amplitude interpretativa que pode conduzir a desfecho perigoso, aonde, me parece, quis o legislador reformador chegar.
Estou falando do parágrafo terceiro do artigo 53, da Constituição Estadual, alterado pela Emenda Constitucional n. 13, de 15 de julho de 2014, publicada no DOE 16.07.2014. Eis a sua integral redação: “§3º. As decisões do Tribunal de Contas, de que resulte imputação de débito ou multa, têm eficácia de título executivo, devendo a Fazenda Pública Estadual ou Municipal, no âmbito de suas competências, encaminhá-las para execução, e com o reconhecimento da boa-fé, a liquidação tempestiva do débito ou multa atualizado monetariamente sanará o processo, se não houver sido observada outra irregularidade na apreciação das contas”.
Metade do texto referido, em especial, até a palavra “execução”, preceitua o lógico ao nosso sistema, inclusive já presente no texto originário, ou seja, que as decisões do Tribunal de Contas transitadas em julgado – não mais admitem recurso no âmbito administrativo –, que obriguem gestores responsáveis por danos ao erário a ressarcir o débito respectivo, assim como a pagar multas em virtude da prática de irregularidades formais, formam títulos executivos. Por consectário, as obrigações constituídas terão o seu cumprimento exigido no Judiciário pela Procuradoria da Fazenda Pública credora, acaso não haja o cumprimento voluntário pelo responsável.
O trecho final do parágrafo, por sua vez, ao que me parece, possibilita a tomada de uma solução esdrúxula que põe em risco o trabalho e a eficácia das decisões do Tribunal de Contas. É que, encaminhada a decisão do Tribunal de Contas para execução, caso o responsável efetue o pagamento voluntário (“com o reconhecimento da boa-fé”) do débito atualizado relativo ao dano ao erário cometido e/ou da multa, o processo, seja ainda no âmbito administrativo da Procuradoria representativa da Fazenda Pública Estadual ou Municipal, ou até mesmo judicial, se “sanará”.
Neste prisma, é imperioso registrar que o cumprimento voluntário ou não das obrigações enseja apenas a extinção do processo executivo, seja na esfera administrativa ou judicial. Assim, juridicamente, não há de se falar em extinção da irregularidade. Com isso, à luz da independência entre as instâncias, nada impede a apuração da conduta do gestor no âmbito criminal e cível, neste último no tocante à improbidade administrativa. Além disso, não há óbice em considerar a irregularidade para fins de restrição eleitoral, haja vista a possível configuração de inelegibilidade, cuja competência declaratória é da Justiça Eleitoral, e não do Tribunal de Contas, como consignado no parágrafo sétimo do artigo 53, da Constituição Estadual, também inserido pela emenda em questão.
Ocorre que a expressão “sanará o processo” remete a ideia de cura. Logo, teremos a superação da irregularidade que ensejou o débito, caso adimplido. Sendo assim, ao menos em tese, será possível esvaziar o trabalho do controle externo exercido pelo Tribunal de Contas, no combate aos maus gestores. Isso porque, bastará o pagamento para que irregularidade já considerada “insanável” torne-se sanada. Desta feita, evita-se que o nome do gestor seja inserido, por exemplo, na lista de gestores com contas rejeitadas por irregularidade insanável – comumente e erroneamente denominada de “lista de inelegibilidade” –, o que facilitará o registro de candidaturas de quem não pode ser votado.
Diante disso, não obstante a provável inconstitucionalidade, acredito ser necessário rever tal disposição, pois, do contrário, abrir-se-á espaço no sistema que pode acomodar uma “gaveta” prejudicial à democracia e aos valores republicanos.
Natal, 23 de julho de 2014.

Henrique Batista é Mestre em Direito pela UFRN, Professor de Direito do UNI-RN e do IAP Cursos, Assessor de Gabinete no TCE/RN, e Advogado.

sábado, 9 de junho de 2012

COMENTE ILEGALIDADE E CAUSA DANO MORAL A OPERADORA DE PLANO DE SAÚDE QUE SUSPENDER O ATENDIMENTO AO USUÁRIO COM BASE EM "SIMPLES ATRASO" NO PAGAMENTO DA MENSALIDADE


O direito à saúde é de ordem fundamental e social, estando intimamente atrelado à vida e a dignidade da pessoa, conforme disposições da Constituição da República. No Brasil, os cidadãos em geral dispõem gratuitamente do calamitoso serviço público de saúde prestado pelos entes federados, consoante gestão do SUS. Por outro lado, para quem pode pagar e busca a garantia de um serviço pouco melhor, existe o sistema privado que suplementa o público, através dos famigerados planos de saúde operados por sociedades empresariais e cooperativas.

No nosso país a iniciativa privada presta serviço de saúde por meio de delegação do Poder Público. Em razão disso fora criada uma autarquia especial denominada de Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) a fim de regulamentar e fiscalizar o setor, a partir das prescrições normativas da “Lei Geral dos Planos Privados de Saúde” (Lei n° 9.656/98). Com efeito, podemos dizer que o mercado de saúde suplementar no Brasil é regulado e as operadoras de planos de saúde estão submetidas, em especial, a referida lei e a atuação da ANS.

Como se percebe qualquer pessoa pode ser usuária de um plano privado de saúde. Para isso basta celebrar contrato com operadora integrante do mercado especializado. Essa garantirá ao usuário, conforme plano contratado e regulamentado pela ANS, os produtos e serviços médicos, hospitalares, clínicos, laboratoriais em geral, dentre outros, por meio de rede própria e/ou credenciada. Para tanto, faz-se necessário o pagamento de mensalidade, cujo valor é fixado conforme o plano escolhido e a idade do usuário, admitindo reajuste anual autorizado pela ANS, bem como, quando há mudança de faixa etária.

Neste esteio, incorrendo o usuário em “simples atraso” no pagamento da mensalidade do plano de saúde pode a operadora suspender a prestação dos serviços? A resposta é negativa, conforme razões que segue.

Em solução a indagação em questão o inciso II, do parágrafo único, do art. 13, da Lei n° 9.656/98, dispõe que o “simples atraso” do usuário no pagamento da mensalidade não autoriza a operadora credora a suspender os serviços do plano de saúde daquele. O atraso que desencadeia a suspensão no atendimento deve ser superior a 60 dias, sejam consecutivos ou não, nos últimos 12 meses de vigência do contrato. Mas só isso não basta. A lei, em vedação a suspensão automática, prescreve que o usuário devedor deve ser comprovadamente notificado até o quinquagésimo dia da inadimplência, respeitando-se, portanto, os princípios da transparência e da harmonia na relação de consumo, além da boa-fé objetiva e o dever anexo de informar, associado a não surpresa da suspensão dos essenciais serviços de saúde.

E diante de eventual violação as regras apontadas, ocorrendo, por conseguinte, a indevida suspensão dos serviços de saúde pela operadora, há dano moral? Aqui, seguindo entendimento jurisprudencial, a resposta deve ser afirmativa.

Apreciando situação idêntica a questão posta, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) declarou a abusividade e a nulidade de cláusula prevista em contrato de plano de saúde que autorizava a operadora a suspender o atendimento em razão do atraso de pagamento de uma única parcela pelo usuário. No caso o STJ foi mais além e considerou como ilícita e caracterizadora de dano moral a referida conduta, conforme facilmente se extrai do acórdão do REsp 259263/SP, da relatoria do ministro Castro Filho, julgado de maneira unânime pela 3ª Turma, em 02/08/2005, e publicado no Diário da Justiça em 20/02/2006, página 330. Registre-se, ainda, que o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte comunga com o entendimento do STJ. É o que se depreende do acórdão da Apelação Cível n° 2010.015694-4, da relatoria do Juiz de Direito convocado Herval Sampaio, julgado a unanimidade pela 1ª Câmara Cível, em 17/05/2011.

Enfim, conclui-se que a suspensão do atendimento e, consequentemente, dos serviços de plano de saúde, praticada por operadora com base em “simples atraso” do usuário no pagamento da mensalidade deve ser considerada ilegal e causadora de dano moral, garantindo ao prejudicado o restabelecimento dos serviços e o direito à indenização.

A VAGA É DA OAB!


Com a aposentadoria do Desembargador Caio Alencar do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Norte (TJRN) uma disputa institucional foi travada. É que aquele, como membro da carreira do Ministério Público do Estado Rio Grande do Norte (MPRN), ocupava uma das vagas do famigerado “quinto constitucional”. Sobre o assunto, o art. 94, da Constituição da República, prescreve que um quinto do Tribunais dos Estados, no caso, o TJRN, será composto de membros do Ministério Público, com mais de 10 anos de carreira, e de advogados de notório saber jurídico e reputação ilibada, com mais de 10 anos de efetiva atividade profissional.

Como a Constituição do Estado do Rio Grande do Norte criou 15 vagas de desembargadores para o TJRN, seguindo a regra do quinto constitucional, 3 delas são obrigatoriamente preenchidas por membros oriundos do MPRN e da Ordem dos Advogados do Brasil, Seccional do Rio Grande do Norte (OAB/RN).

Atualmente, na composição do TJRN temos a Desembargadora Judite Nunes como representante do MPRN e o Desembargador Cláudio Santos pela OAB/RN. Assim, com quem ficará a terceira vaga aberta com a aposentadoria do Desembargador Caio Alencar? MPRN ou OAB/RN?

O MPRN defende que a vaga é fixa e pertence em definitivo à instituição, assim como é a vaga destinada à OAB/RN ocupada pelo Desembargador Cláudio Santos. Seguindo este raciocínio, a vaga do rodízio seria apenas a ocupada pela Desembargadora Judite Nunes. A OAB/RN, por sua vez, advoga que para manter a paridade deve haver um rodízio entre as instituições, e como o MPRN passou anos com as duas cadeiras, agora é a vez do advogado.

Como se percebe, o art. 94 referido acima não soluciona a questão em análise. A solução está no §2° do art. 100, da Lei Complementar n° 35/79 (Lei Orgânica da Magistratura Nacional - LOMAN) que dispõe que nos Tribunais em que for ímpar o número de vagas destinadas ao quinto constitucional - caso do TJRN - uma delas será, alternada e sucessivamente, preenchida por advogado e por membro do Ministério Público, de tal forma que, também sucessiva e alternadamente, os representantes de uma dessas classes superem os da outra em uma unidade. Nesta esteira, resta claro que tendo o MPRN superado a OAB/RN por um bom tempo, agora chegou a vez desta o superar.

Para por termo ao debate, apreciando idêntica questão por duas vezes, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu pela incidência da regra da LOMAN, conforme razões facilmente extraídas do MS 20.597/DF, da relatoria do então ministro Octavio Gallotti, julgado em 22/10/1986 e publicado no Diário da Justiça em 05/12/1986; e do MS 23.972/DF, da relatoria do também então ministro Carlos Velloso, julgado em 12/9/2001 e publicado no Diário da Justiça em 29/8/2003.

Em arremate, seguindo entendimento do STF, ocorrendo vaga a ser preenchida pelo quinto constitucional e uma das classes se achar em inferioridade na composição do Tribunal, inverter-se-á a situação: a classe que se achava em inferioridade passa a ter situação de superioridade, atendendo-se, destarte, ao princípio constitucional da paridade entre as duas classes, Ministério Público e advocacia.
              
               Diante de tais considerações a disputa institucional local e em curso se mostra infundada. Enfim, tendo a OAB/RN uma cadeira no TJRN, agora deve passar a duas.

sábado, 28 de abril de 2012

DAS TUTELAS DE URGÊNCIA NO PROJETO DO NOVO CPC


INTRODUÇÃO

Dentre as garantias constitucionais do processo temos o acesso à justiça. Esta, por sua vez, materializa-se pelo exercício do direito de ação que assiste a todo cidadão e visa um provimento jurisdicional do Estado-juiz, a fim de pacificar um conflito.

Ocorre que a resposta jurisdicional quanto ao direito material, inevitavelmente, deve passar por uma sistemática lógica de aplicabilidade do Direito denominada procedimento. Este é inerente a um processo ou instrumento, por meio do qual se solução a lide. Assim, podemos dizer que associada à citada garantia temos o devido processo legal na vertente material e adjetiva.

Assim, é fato que a prestação jurisdicional implica tempo e que nem sempre este pode ser esperado pela parte. Por esta razão, ou seja, pela necessidade de um agir jurisdicional antecedente que vise preservar o bem da vida e evitar o perecimento de direito, surgiu à técnica procedimental denominada de tutela ou provimento jurisdicional urgente.

Nesta rota, o simplório ensaio visa analisar as tutelas de urgência na sistemática atual do CPC, comparando-as com o que vem sendo trabalhado no projeto do novo CPC.

1 DAS TUTELAS DE URGÊNCIA: CONCEITO, ESPÉCIES, OBJETOS, REQUISITOS E PEDIDO

1.1 Conceito

Por tutela se entende proteção. Já urgência a situação fática que requer uma intervenção imediata. Para o Direito e, sobretudo, o processual, tutela ou provimento, em sentido amplo, significa proteção do direito material. Assim, configura-se uma resposta de plano do Estado-juiz, ou seja, antes do provimento final, do término do feito, o demandante já pode ter uma manifestação judicial em torno do seu pleito, em verdadeira cognição sumária, ante as implicações fáticas postas. Em outras palavras, a tutela jurisdicional urgente é a providência imediata e efetiva de entrega do bem da vida ou do acautelamento deste.

Para Sampaio Júnior, tutelas de urgência seriam “todas aquelas medidas que são concedidas no decorrer do processo, em especial no seu início, tendo como premissa a questão do perigo de ineficácia da tutela em razão de uma emergência[1]. Com efeito, são verdadeiros mecanismos de sumarização, na perspectiva de que para garantir o bem da vida exigi-se o necessário respeito à tempestividade.

Saliente-se que, não obstante serem materializadas em decisão interlocutória, a jurisprudência passou a admitir a concessão de tutela de urgência em sentença, ou seja, na fase final do procedimento. Contudo, temos que convir que tal proceder acaba comprometendo o propósito dos provimentos liminares e, até mesmo, a garantia do acesso à justiça e da razoável duração do feito.

1.2 Espécies e Objetos

As tutelas de urgências ou provimento liminar é gênero do qual são espécies a tutela satisfativa e a tutela de segurança. A primeira tem como subespécies a tutela antecipada genérica, a específica e a inibitória; já a segunda há apenas a tutela cautelar.

No provimento liminar de natureza satisfativa, ao contrário da tutela de segurança, ocorre à antecipação do bem da vida ante a quase certeza do direito percebida pelo juiz em sua análise sumária inicial. Na tutela de segurança o que se tem na aferição do magistrado é mera aparência do direito, visando o provimento apenas assegurar, proteger o direito que será objeto de demanda cognitiva ou satisfativa, sem que haja antecipação do bem da vida.

1.3 Requisitos

1.3.1 Da Tutela Antecipada Genérica

A tutela antecipada genérica (CPC, art. 273 e §§) somente deve ser concedida, parcial ou totalmente, quando houver requerimento da parte[2] e a configuração de todos os requisitos legais autorizadores, quais sejam: verossimilhanças das alegações autorais; provas inequívocas; fundada receio de dano irreparável ou de difícil reparação, ou abuso do direito de defesa; e, reversibilidade da medida.

Por verossimilhança das alegações autorais entende-se a quase certeza do que está sendo posto para apreciação. Seria a plausibilidade ou probabilidade do reconhecimento do direito e da entrega do bem da vida ao final do procedimento. Para tanto, tem-se por indispensável às provas inequívocas ou pré-constituídas, ou seja, aquelas que aclarem, de plano, a controvérsia da lide, não proporcionando dúvida ao julgador ou, se persistirem, que sejam residuais.

Quanto ao fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação tem-se a situação fática posta para apreciação do Juízo com as devidas provas do dano ou do risco deste. Por outro lado, mesmo que tal circunstância não seja configurada pode o magistrado antecipar a tutela se restar evidente o abuso do direito de defesa por parte do réu, em vilipêndio as regras inerentes a lealdade processual ante a provocação de incidentes manifestadamente infundados e a resistência injustificada ao andamento do feito, em situações processuais protelatórias.

Ademais, deve ser reversível a medida a conceder, ou seja, a revogação ou a cassação do provimento liminar não pode compromete substancialmente os fatos, podendo retornar ao status quo ante.

1.3.2 Da Tutela Antecipada Específica e Da Inibitória

A tutela antecipada específica (CPC, art. 461 e §§), por sua vez, ocorre quando a ação tem por objeto o cumprimento da obrigação de fazer ou a entregar coisa certa, ou seja, que visa a execução forçada de uma conduta positiva do devedor inadimplente, seja com o fato ou a coisa. Para a concessão desta basta ser relevante o fundamento da demanda e existir justificado receio de ineficácia do provimento final (§3°).

De igual modo, temos a tutela antecipada inibitória quanto aos requisitos autorizadores, havendo distinção apenas quanto à natureza da obrigação a qual visa o cumprimento forçado, qual seja: obrigação de não fazer ou negativa, isto é, o respeito à abstenção ajustada.

1.3.3 Da Tutela Antecipada de Evidência

Para doutrina o § 6° do art. 273, do CPC, trata de uma tutela antecipada diferenciada das demais, cognominando-a de tutela de evidência. Assim, em situações em que existe um ou mais dos pedidos cumulados, ou parcela deles, mostrar-se incontroverso, pode o juiz conceder a tutela antecipada sem a necessidade da análise dos outros requisitos autorizadores do provimento liminar satisfativo. Por oportuno, assente-se que, por ser incontroverso, a solução provisória passa a ser definitiva.

1.3.4 Da Tutela Cautelar

No tocante à segurança temos a tutela cautelar. Esta é concedida quando configurado o fumus boni in iure ou fumaça do bom direito, que diz respeito à mera aparência do direito que será discutido no feito principal; e o perriculum in mora ou perigo da demora, que se refere ao risco de dano ao bem da vida a ser perseguido naquele. As medidas em pleito desta natureza tanto pode ser típica ou nominada, como atípica ou inominada, haja vista o poder geral de cautela do juiz.

1.4 Do Pedido

Registre-se a aplicabilidade da fungibilidade do pedido às tutelas de urgência (§7º do art. 273, do CPC). Isto implica dizer que o juiz pode conhecer de pleito liminar satisfativo e em qualquer de suas espécies como sendo cautelar e vice-versa. Assim, temos uma visão de “mão dupla”, não obstante as resistências doutrinárias, bastando, para tanto, a identificação dos requisitos específicos e a adequação, conforme o provimento concedido.

Assente-se, ainda, que o pleito liminar pode ser realizado a qualquer momento antes da sentença, não havendo, portanto, a obrigatoriedade de restar consignado na exordial. Ademais, se mantida a compatibilidade com o objeto da demanda, ele pode ser modificado sem a anuência do réu, mesmo que já devidamente citado. Por último, frise-se que a apreciação pode ser inaudita altera pars, ou seja, antes da instauração do contraditório, ou não.

2 DO PROJETO DO NOVO CPC

2.1 Das Tutelas de Urgência: Satisfativa e Cautelar

No projeto do novo CPC são espécies de tutelas de urgência apenas a satisfativa e a cautelar. Na mesma rota do trabalhado acima, visam às medidas satisfativas antecipar ao autor, no todo ou em parte, os efeitos da tutela pretendida, enquanto que as cautelares têm por objeto afastar riscos e assegurar o resultado útil do processo.

É cediço que as tutelas de urgência podem ser requeridas antes ou no curso do processo. Ocorre que o projeto do CPC inova na medida em que admite que o juiz conceda ex officio as medidas que considerar adequadas quando houver fundado receio de que uma parte, antes do julgamento da lide, cause ao direito da outra lesão grave e de difícil reparação. Ademais, a medida de urgência poderá ser substituída, de ofício ou a requerimento de qualquer das partes, pela prestação de caução ou outra garantia menos gravosa para o requerido, sempre que adequada e suficiente para evitar a lesão ou repará-la integralmente.

Percebe-se uma uniformização, bem como, uma simplificação dos requisitos autorizadores das tutelas de urgência em relação as suas espécies. Assim, tanto para a concessão da satisfativa quanto apara a cautelar, basta apenas que sejam demonstrados elementos que evidenciem a plausibilidade do direito, assim como o risco de dano irreparável ou de difícil reparação.

Inova o legislador ao positivar a exigência para concessão liminar de tutela de urgência da caução real ou fidejussória idônea, visando ressarcir os danos que o requerido possa vir a sofrer, ressalvada a impossibilidade da parte economicamente hipossuficiente. Em síntese, enaltece a contracautela.

Com efeito, com a generalização tem-se que não há mais a divisão formal em tutela antecipada genérica, específica e inibitória. Contudo, isso não impede que o juiz ao deferir uma tutela de urgência satisfativa delimite o provimento em um daqueles temos.

Quanto à inibitória, acreditamos que o legislador está a perder uma grande oportunidade para instituir o seu disciplinamento. Por outro lado, consoante afirmado acima, nada impedirá o seu manejo, apreciação e concessão, cabendo a jurisprudência essa construção.

Em relação ao processo cautelar, a generalização apontada põe termo a sua instrumentalização, extinguindo o livro III do atual CPC. Isto, no entanto, não implicará na extinção das medidas e dos provimentos de natureza cautelar. Assim, a extinção dos nomem juris e do procedimento para cada espécie não impede o manejo e a abertura interpretativa, o que eleva a relevância do poder geral de cautela inerente ao magistrado.

2.2 Da Tutela de Evidência

Ainda no campo da inovação temos a tutela de evidência como provimento autônomo e distinto das tutelas de urgência. Enquanto nestas a cognição é sumária, naquela é exauriente. Logo, resta ao julgador o poder de conceder uma tutela já definitiva, isto porque, não há qualquer risco para o processo ou até mesmo para o direito material.

Assim, consoante disciplina o projeto do novo CPC, a tutela da evidência será concedida, independentemente da demonstração de risco de dano irreparável ou de difícil reparação, quando: I - ficar caracterizado o abuso de direito de defesa ou o manifesto propósito protelatório do requerido; II - um ou mais dos pedidos cumulados ou parcela deles mostrar-se incontroverso, caso em que a solução será definitiva; III - a inicial for instruída com prova documental irrefutável do direito alegado pelo autor a que o réu não oponha prova inequívoca; ou, IV - a matéria for unicamente de direito e houver tese firmada em julgamento de recursos repetitivos, em incidente de resolução de demandas repetitivas ou em súmula vinculante.

Esta nova vertente processual mostra-se em consonância com a efetividade do direito, a uniformização do direito objetivo, a segurança jurídica, a sumarização material e procedimental, a economia processual, a efetivação e a razoável duração do processo.


CONSIDERAÇÕES FINAIS

As tutelas de urgência foram inovações acertadas do legislador, visto que conferem maior efetividade ao processo, mediante a melhor distribuição do prejuízo da demora do procedimento. Assim, acaso o demandante preencha os pressupostos legais, obterá de pronto o direito substancial firmado na exordial ou a preservação deste, evitando assim o seu perecimento ante os passos lentos da relação jurídico-processual.

O projeto do novo CPC tende a uniformizar os provimentos de tal natureza ao tratar do satisfativo e do cautelar em conjunto, quando a cognição for sumária. Essa circunstância ocasionará o fim do processo cautelar, mas não das medidas dessa natureza, que poderão ser absorvidas e concedidas, consoante o poder geral de cautela do juiz.

Não obstante tenha causado espécie a vários processualistas, o projeto do novo CPC não vem privilegiando a tutela inibitória, isto é, não trata de procedimento algum referente a mesma.

Por último, saliente-se que, no esteio dos ensinamentos de Marinoni, ao contrário do que ocorre com a tutela inibitória, o projeto do novo CPC trabalha acertada e profundamente a tutela de evidência. Esta é vista como autônoma em relação à satisfativa, sob a premissa de ser de cognição exauriente, conferindo o julgador a possibilidade de conceder uma tutela já definitiva.

REFERÊNCIAS

SAMPAIO JÚNIOR, José Herval. Tutelas de urgência no anteprojeto do novo CPC.

MARINONI, Luiz Guilherme. Teoria geral do processo. São Paulo: RT, 2010.

__________. Tutela específica arts. 461, CPC e 84, CDC. São Paulo: RT, 2001.

Projeto de lei n° 166/2010, decorrente do anteprojeto do novo CPC ainda em tramitação no Congresso Nacional.



[1] SAMPAIO JÚNIOR, José Herval. Tutelas de urgência no anteprojeto do novo CPC.
[2] Não é o propósito do trabalho, mas há corrente que sustenta a concessão ex officio a partir do poder geral de cautela que assiste ao magistrado.