SUMÁRIO: 1 INTRODUÇÃO. 2 O APELO
CÍVEL. 2.1 Da sentença, dos pressupostos e do objeto. 2.2 Da regularidade
formal, do procedimento no primeiro grau e dos efeitos. 2.3 Da tantum devolutum quantum appellatum e as
implicações. 2.4 Da instrução. 2.5 Do julgamento e dos efeitos. 3 O PROJETO DO
NOVO CPC E AS ALTERAÇÕES. 4 CONSIDERAÇÕES FINAIS. REFERÊNCIAS.
1
INTRODUÇÃO
Dentre as garantias
constitucionais do processo temos o acesso à justiça. Esta, por sua vez,
materializa-se pelo exercício do direito de ação e de defesa que assiste a todo
cidadão e visa um provimento jurisdicional justo emanado do Estado-juiz, a fim
de pacificar um conflito.
Ocorre que a resposta
jurisdicional além de sujeita a erros, já que é produzida por humanos,
naturalmente gera inconformismo no ser quando cientificado da eventual derrota.
Nesta perspectiva, a sistemática lógica de aplicabilidade do Direito
possibilita a revisão do julgado por órgão superior, a partir do desdobramento
do direito de ação e defesa. Para tanto, a parte interessada deve se valer dos recursos
previstos em lei. Assim, podemos dizer que associada ao acesso à justiça temos
a garantia do devido processo legal, associado à ampla defesa e contraditório
com os meios que lhes são inerentes[1].
Nesta rota, no processo
civil temos a apelação, recurso por excelência que remete ao Tribunal, órgão
superior hierárquico imediato, o conhecimento da matéria discutida e decidida,
de maneira definitiva, por instância inferior. Sobre esse expediente recursal
vejamos algumas simplórias notas, observando, inclusive, as potenciais alterações
que possam surgir com a eventual promulgação do projeto no novo CPC.
2 O
APELO CÍVEL
2.1 Da
sentença, dos pressupostos e do objeto
Dentre os provimentos
jurisdicionais, temos a sentença. Este é ato do juiz que dispõe de viés
terminativo do feito é verdadeiro silogismo. Assim, após análise da tese
autoral e da antítese do réu, o intérprete e julgador, expõe suas razões de
decidir e conclui, decide, fazendo consignar seu ato na parte preceitual.
Saliente-se que, o juiz
provocado por meio de uma ação deve seguir o objeto desta, ou seja, sua
apreciação deve ser informada pelo princípio da congruência ou correlação entre
o pedido e o dispositivo, ou decidido. Nesta senda, para cada fundamento e
decisão forma-se um capítulo, logo, uma sentença pode ter diversos capítulos em
seu dispositivo, seja de caráter declaratório, constitutivo, condenatório,
mandamental e executivo lato senso, consoante visão quinpartite de Pontes de
Miranda.
A sentença põe termo ao
processo resolvendo o mérito ou não. No primeiro caso a o enfrentamento do
pedido, enquanto que no segundo não, porquanto, classifica-se o ato como
sentença processual, pois, a análise do objeto é comprometida por aspectos
formais, entre eles: a ausência dos pressupostos processuais positivos de
existência (jurisdição, petição inicial, citação válida e capacidade
postulatória) e de validade (petição inicial apta, órgão jurisdicional
competente, juiz imparcial, capacidade de agir e processual), a presença dos
pressupostos negativos (perempção, litispendência e coisa julgada), a falta das
condições da ação (legitimidade ativa e passiva ad causam, possibilidade jurídica e interesse de agir), o abandono
da causa, a desistência do autor, a confusão entre autor e réu, a ação for
personalíssima ou intransmissível, a convenção de arbitragem e o indeferimento
da exordial por inépcia, dentre outros. Contra este ato judicial, seja
meritório ou processual, no esteio dos princípios da tipicidade e do cabimento
recursal, a legislação instrumental prevê a apelação[2].
A apelação deve ser
interposta no prazo legal de 15 (quinze) dias, mediante preparo ou recolhimento
das custas, salvo se o recorrente for beneficiário da assistência judiciária
gratuita, Ministério Público ou Fazenda Pública.
Caso não haja o preparo o
recurso será considerado deserto, contudo, esta decisão pode ser revertida
acaso o apelante demonstre justo impedimento para o não recolhimento, a
exemplo, falha no sistema de emissão da guia no último dia do prazo ou qualquer
outro problema imputado a rede bancária, etc. Assim, o juiz relevará a pena,
abrindo prazo para o recolhimento. Outra circunstância é quando o recolhimento
ocorreu, mas a menor. Nesta hipótese, deve o juiz intimar o recorrente para que
complemente as custas no prazo de 05 (cinco) dias, sob pena de deserção[3].
Quanto à legitimidade
recursal, tem-se que a apelante deve ser parte, o Ministério Público, como
parte ou fiscal da lei, ou terceiro prejudicado, admitindo-se, também,
consoante jurisprudência do STJ, a legitimidade ao advogado da parte no tocante
aos honorários sucumbenciais, haja vista se tratar de direito autônomo.
Associado a legitimidade deve haver o interesse recursal que está ligado à
sucumbência da parte, a afronta a lei compreendida pelo parquet ou ao prejuízo sinalizado pelo terceiro[4].
Por derradeiro, em relação
ao objeto recursal, tem-se que a apelação ataca o dispositivo sentencial, logo
o pedido deve ser de anulação de parte ou de todo o ato do juízo a quo, ou a reforma do(s) capítulo(s) presentes.
2.2
Da regularidade formal, do procedimento no primeiro grau e dos efeitos
Em respeito à regularidade
formal, o recurso de apelação deve ser interposto por meio de petição escrita dirigida
ao juízo prolator, acompanhada das razões do apelo que deve ser endereçada ao
juízo ad quem, ambas firmadas por
advogado devidamente constituído e habilitado nos autos. Saliente-se que com a
“Lei do Fax”, a interposição pode ser feita por fax-smile no prazo recursal, devendo o apelante apresentar os
originais em até cinco dias após o término do prazo, sob pena de não
conhecimento do recurso por intempestividade.
O expediente recursal que
compreende as razões deve ser articulado, constando a exposição de motivos ou
fundamento da pretensão recursal que impugne especificamente os fundamentos da
decisão recorrida que sustentou o dispositivo em ataque.
Interposto o recurso deve o
juízo a quo realizar o juízo de
admissibilidade inicial ou de prelibação, ou seja, analisar se o recurso
preenche todos os pressupostos supra indicados. Em caso positivo, receberá o
recurso, abrindo o prazo para o recorrido contrarrazoar, remetendo, em seguida,
o feito ao juízo ad quem. Por outro
lado, caso a decisão do juízo a quo
seja no sentido de denegar o recebimento do apelo por inobservância de um dos
pressupostos ou por súmula impeditiva de recurso, abri-se a via do agravo de
instrumento ao Tribunal de apelação. Chegado ao órgão revisor, com juízo
positivo no primeiro grau ou provimento do agravo, será feito novo juízo de
admissibilidade ou de delibação pelo relator[5].
Ainda no campo da
interposição, em matéria de sucumbência recíproca, a parte que resolver não
recorrer da parte em que sucumbiu, poderá ter nova oportunidade de recurso.
Isto porque, diante do recurso da parte adversa e deflagrada a fase de
contrarrazões, poderá se valer do recurso de apelação na forma adesiva, que é
acessório do apelo principal. Então, além de contrarrazoar, surge uma nova
oportunidade para recorrer, contudo, adesivamente, de maneira acessória, visto
que, se houve desistência do apelo principal, ou o não conhecimento do apelo
principal por ausência de um dos pressupostos recursais, ou por ser deserto, o
recurso de apelação adesivo resta comprometido.
Ainda no primeiro grau, em
regra, o apelo deve ser recebido nos efeitos devolutivos, ou seja, toda a
discussão ou a matéria impugnada será devolvida ao juízo ad quem, e suspensivo, visto que a decisão ainda não poderá ser
executada, cumprida. No entanto, há hipóteses em que pode ser deflagrada a
execução provisória sob total responsabilidade do exequente, já que o recurso
será recebido apenas no efeito devolutivo, pois a decisão se presta a homologar
a divisão ou a demarcação, a prestação de alimentos, a solução de feito
cautelar, a rejeitar liminarmente embargos à execução ou julgá-los
improcedentes, a reconhecer o pedido de instituição de arbitragem e a conceder
ou confirmar a antecipação dos efeitos da tutela[6].
2.3
Da tantum devolutum quantum appellatum
e as implicações
O efeito devolutivo é
clássico, sendo o efeito por excelência do apelo. Consiste na devolução ao
Tribunal da matéria que foi discutida no primeiro grau, na medida do apelo,
isto é, da impugnação. Assim, conforme o ataque do apelante aos capítulos da
sentença presente no dispositivo[7],
seja parcial ou total, o Tribunal recebe a matéria para reexame. Em síntese, a
extensão da devolução é a do apelo, conforme preceitua o brocardo latino tantum devolutum quantum appellatum[8].
Por outro lado, há de se
admitir a profundidade da devolução, visto que o Tribunal, além de conhecer as
matérias impugnadas pelo apelante, poderá também enfrentar todas as que foram
suscitadas e debatidas no processo, mas não foram consignadas na sentença,
muito menos no dispositivo, assim como as questões anteriores a sentença que
sequer foram decididas[9].
Na mesma rota, quando o pedido ou defesa tiver mais de um fundamento e o juiz
acolher apenas um desses, pode o Tribunal apreciar os demais, mesmo que não
seja alvo da impugnação, já que não constará na parte preceitual.
Contudo, assente-se que,
apesar da possibilidade de extensão do efeito devolutivo, não pode haver
inovação fática em sede de apelo. Ou seja, as questões não propostas no juízo
inferior, em regra, não poderão ser conhecida pelo Tribunal, salvo se a parte
provar que deixou de fazê-lo por motivo de força maior. Tal circunstância
difere da hipótese em que o Tribunal confere outra interpretação ao mesmo fato,
ou entende por incidência de outra norma ao caso[10].
Neste caso, não há falar em alteração da causa de pedir ou violação ao
princípio da congruência, ao contrário do que ocorre na hipótese de inovação
sem justificativa plausível.
2.4
Da instrução
Em se tratando de sentença
proferida sem resolução de mérito não há falar em instrução, ao menos em tese,
já que os pressupostos processuais positivos e negativos, as condições da ação,
o abandono, a convenção de arbitragem, dentre outros, em regra, são
identificados na fase inicial do feito ou, ao que se espera à luz da economia
processual, até a fase saneadora. Já na de mérito, salvo a hipótese de julgamento
antecipado da lide, quando a questão é direito, ou sendo de direito e de fato,
este já se encontra perfeitamente documentado, ou, ainda, em caso de revelia,
há instrução.
Assim, em apreciação de
sentença processual que o Tribunal entenda pela regularidade instrumental,
anulando o provimento do juízo a quo,
deve o feito, salvo a hipótese de questão exclusivamente de direito e “causa
madura”, ser remetido a origem para o devido processamento e análise do mérito.
Nesta hipótese, o juízo a quo é o natural
da instrução, sob pena de supressão da instância teoricamente instrutória, ou
inversão dos papeis jurisdicionais.
Em se tratando de sentença
de mérito em que tenha ocorrido a instrução e o Tribunal constatando nulidade
sanável, poderá determinar a realização ou renovação do ato processual, sem que
os autos desçam ao primeiro grau. Assim, basta intimar as partes para cumpram a
diligência determinada, devendo o feito, em seguida, se possível, ser pautado
para julgamento do apelo[11].
2.5
Do julgamento e dos efeitos
Com a apreciação do mérito
do apelo pelo segundo grau, seja pelo órgão fracionário ou pelo pleno, a
depender das hipóteses regimentais, a pretensão recursal pode ser acolhida ou
rejeitada, no todo ou em parte. Assim, teremos o provimento pleno ou parcial do
recurso que comprometerá o dispositivo da sentença atacada, seja pela anulação
ou reforma. Caso a decisão seja no sentido do improvimento a sentença será
mantida em seus próprios termos.
Dentre os efeitos
decorrentes deste ato podemos citar três: o translativo, o regressivo e o
substitutivo. O primeiro possibilita o conhecimento, de ofício, de questões de
ordem pública, visto que não impera a preclusão. A incidência deste efeito não
nega vigência a reformatio in pejus.
Já o segundo acontece em caráter excepcional, pois, em regra, proferida a
sentença o juiz não pode alterá-la, até mesmo em caso de retratação. O exemplo
que temos diz respeito à retratação no prazo impróprio de 48 horas diante de
apelo interposto em face de sentença que indeferiu a preambular. Assim, é
efeito aferido no primeiro grau[12].
Por derradeiro, o terceiro e
mais importante efeito é o substitutivo. Este preceitua que o provimento do
juízo a quo, caso o Tribunal conheça do apelo e enfrente o pedido, é
substituído pelo acórdão. Em suma, o acórdão é decisão que substitui outra,
qual seja: a sentença atacada.
3 O
PROJETO DO NOVO CPC E AS ALTERAÇÕES
Nos últimos
meses o famigerado projeto de um novo CPC alcançou o nível de debate esperando,
quer seja na academia, que seja no mundo político. Em relação à apelação, até o
presente, pouco se pretende modificar. Substancialmente podemos apontar a
extinção do juízo de admissibilidade no primeiro grau, devendo o mesmo se
limitar ao segundo[13].
Além disso, se
propõe que o recebimento do apelo pelo Tribunal somente pode ser no efeito
devolutivo, no entanto, ao relator é dado a atribuição do efeito suspensivo em
decisão irrecorrível[14].
Pugnam, ainda,
pelo elastecimento do juízo de retratação ou efeito regressivo do apelo,
possibilitando o exercício do mesmo para todas as hipóteses de sentença sem
resolução de mérito, cuja interposição do apelo possibilita o juiz se retratar no
prazo de 3 (três) dias[15].
No campo da
instrução, acaso o Tribunal entenda pela deficiência das provas poderá converter
o julgamento em diligência, podendo o feito descer ao primeiro grau ou ser
instruído no próprio segundo[16].
Enfim, para maior economia e em respeito à
razoável duração do processo, o legislador indicou em rol exemplificativo as
hipóteses em que se configura a causa madura, devendo o Tribunal julgá-las.
Assim, sempre que envolver
reforma de sentença fundada no art. 472 (coisa julgada em relação a terceiros);
declaração de nulidade de sentença por não observância dos limites do pedido;
declaração de nulidade de sentença por falta de fundamentação; e, reforma da
sentença que reconhecer a decadência ou prescrição, deve o Tribunal julgar de
imediato[17].
4
CONSIDERAÇÕES FINAIS.
A apelação cível é o recurso
por excelência do processo civil, cujo espectro de cognição do Tribunal é
amplo. Ele, enquanto desdobramento do direito de ação e defesa ataca a decisão
mestra, ou seja, enfrenta a sentença, provimento terminativo do feito, sendo um
dos mais autos pontos da legislação instrumental.
Do presente ensaio
percebe-se que, não obstante o sistema ser informado pelo princípio da
instrumentalidade das formas, o apelo é, por demais, formal, ou de rigor. Não
basta observar os pressupostos processuais e as condições da ação, ele deve
seguir uma regularidade de apresentação.
A força da decisão em sede
de apelo é tamanha que pode comprometer o trabalho do juízo a quo, quando anulada a sentença. Em suma, é expediente de
magnitude opositiva inquestionável.
Por derradeiro, vimos o
projeto do novo CPC em pouco inova em matéria de apelo, mantendo todas as
diretrizes clássicas, com exceção para hipótese de extinção do juízo de
prelibação e a abertura do efeito regressivo.
REFERÊNCIAS
BRASIL. Projeto de lei n° 166/2010,
decorrente do anteprojeto do novo CPC ainda em tramitação no Congresso Nacional.
DINAMARCO, Cândido Rangel. Capítulos de
sentença. São Paulo: Malheiros, 2002.
JORGE, Flávio Cheim. Apelação cível – Teoria
geral e admissibilidade. 2ª ed., ver. e atual. São Paulo: RT, 2002.
MARINONI, Luiz Guilherme. Teoria geral do
processo. São Paulo: RT, 2010.
OLIVEIRA, Gleydson Kleber Lopes de. Apelação
no direito processual civil. São Paulo: RT, 2009.
THEODORO JR., Humberto. Curso de direito
processual civil, v. I, II e III. Rio de Janeiro: Forense, 2008.
[1] MARINONI, Luiz
Guilherme. Teoria geral do processo. São Paulo: RT, 2010.
[2] THEODORO JR.,
Humberto. Curso de direito processual civil, v. I. Rio de Janeiro: Forense,
2008, p. 258.
[3]
THEODORO JR., op. cit., p. 262-266.
[4]
THEODORO JR., op. cit., p. 262-266.
[5] JORGE, Flávio Cheim.
Apelação cível – Teoria geral e admissibilidade. 2ª ed., ver. e atual. São
Paulo: RT, 2002, p. 34.
[6] JORGE, op. cit., p. 42.
[7] DINAMARCO, Cândido Rangel. Capítulos
de sentença. São Paulo: Malheiros, 2002.
[8] OLIVEIRA, Gleydson
Kleber Lopes de. Apelação no direito processual civil. São Paulo: RT, 2009, p.
178 ss.
[9] OLIVEIRA, op. cit., p. 178 ss.
[10] OLIVEIRA, op. cit., p. 178 ss.
[11] OLIVEIRA, op. cit., p. 210 ss.
[12] OLIVEIRA, op. cit., p. 255 ss.
[13] BRASIL. Projeto de
lei n° 166/2010, decorrente do anteprojeto do novo CPC ainda em tramitação no
Congresso Nacional. Disponível em: . Acesso em:
25/09/2011.
[14] BRASIL, op. cit.
[15] BRASIL, op. cit.
[16] BRASIL, op. cit.
[17] BRASIL, op. cit.
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